#18 - A INTENCIONALIDADE NATURAL
- Deixa Eu Pensar
- 21 de jun. de 2024
- 3 min de leitura
É possível ser natural?
Alguém acabou de contar uma piada. Ela é boa! Você ri! Você não escolheu rir, mas ri com alegria.
Alguém acabou de contar uma piada e ela é péssima. Você não ri! Você não escolheu não rir, apenas não houve graça.
Duas reações que parecem bem naturais, certo?
Mas então, não querendo desagradar o piadista, você se força a dar uma risadinha, só pra afirmar positivamente aquela situação, evitar constrangimentos... Essa reação deixou de ser natural?
Houve um raciocínio lógico, uma decisão, uma intenção internamente justificada que exigiu esforço físico e mental. Um comportamento pensado deixa de ser natural?
E se esse comportamento de sempre tentar evitar desagrados for tão frequente e inconsciente que você o faz automaticamente, sem pensar, da mesma forma que aquela risada espontânea. Isso o tornaria natural?
O que é o natural, afinal?
A Filosofia da Natureza vai dizer que é tudo aquilo que é físico e respeita as leis e os fenômenos observáveis, incluindo tudo que existe, independente da intervenção humana. As Ciências Naturais já o definem como fenômenos que ocorrem espontaneamente, ainda no mundo físico e que podem ser estudados e entendidos.
Quando falamos sobre Moral e Ética, a coisa fica mais complicada. O natural pode ser usado para declarar comportamentos que são considerados intrínsecos aos seres humanos ou ao mundo animal, contrastando bem daqueles que são culturalmente induzidos.
A Filosofia da Mente aborda a capacidade de explicar estados mentais em termos de processos físicos e biológicos. Mas no dia a dia, usamos o natural de forma banalizada. Geralmente para descrever coisas que ocorrem de forma habitual, sem intervenção.
Definir o que é natural pode ser complicado e muitas vezes contraditório. E essa busca por uma naturalidade pessoal, uma essência que define nossos comportamentos, que define quem somos, na realidade talvez não exista da forma que imaginamos.
Afinal, poderíamos dizer que os comportamentos mais naturais possíveis são os instintivos, como comer ou dormir, igual todos os animais inconscientes. E então, alegar que a partir do momento que existe algo além do instinto, existe uma intenção além da natureza.
Logo, se comportamentos intencionais nos deixam cada vez mais longe da naturalidade, isso significa que somos artificiais na maior parte do tempo?
E isso é bom ou ruim? Para quem?
Sempre para alguém, e é nesse ponto que muitas vezes o questionamento principal reside: somos naturais ou artificiais aos olhos de quem?
O piadista, quando viu a sua risada forçada, acreditou que você tenha gostado da piada. Nada fora do normal. “Eu sou um ótimo piadista, se riu, foi bom”. Mas uma terceira pessoa presente, que te conhece muito bem, percebeu na hora que a risada era falsa.
Então, a percepção desse natural social depende do contexto, do histórico, do que é comum dentro de um grupo ou de uma intimidade. E essa construção de natural provavelmente é artificial.
Como saber se os comportamentos que você teve no dia são realmente algo inerentes da sua pessoa ou da sua personalidade? Ou são condicionamentos adquiridos ao longo de repetições de padrões durante toda a sua vida. A pulga atrás da orelha é: será que existe mesmo Personalidade ou só estamos seguindo um fluxo cultural ou artificial de forma conformada?
Esse questionamento sobre comportamentos dentro de núcleos sociais não tem o objetivo de jogar o humano como um ser artificial num mundo natural. Apenas trazer a luz que esse natural tão cru talvez já tenha sido perdido há muitos anos, desde que a consciência mental se fez valer.
Quando falamos em naturalidade, em sermos nós mesmos, em seguir nosso coração, em agir em nossa essência... Sempre estamos falando em relação a algo. Algo que já foi, ou algo que ainda há de ser. E isso faz com que busquemos um natural que se acomode ao que é padrão, gerando esse para doxo de termos que ter comportamentos de acordo com uma convenção ao mesmo tempo que queremos imprimir algo somente nosso, íntimo, único, que nos torna esse ser tão natural.
E apesar de todo esse conflito, o que acaba sendo natural pra gente geralmente se encontra em um ponto de conforto, de harmonia, até de leveza de consciência, mesmo que esse natural tenha sido naturalizado através de processos e experiências complexas e desgastantes.
Talvez a intenção não seja natural ou talvez a natureza seja intencional.
Mas entender sua busca por naturalidade requer intenção e a intenção que você coloca no mundo vai transformando, de pouquinho em pouquinho, aquilo que para você, é natural.
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